Os conceitos de rede e conexão encontram-se, a par com o de realidade, dentro dos campos da nossa linguagem mais afectados pela revolução que deriva dos recentes avanços das tecnologias da comunicação. A banalização de termos como estar ligado, estar em rede, redes públicas e privadas, de trabalho ou domésticas, e a sua integração na linguagem corrente, onde aparecem muitas vezes plasmados a outros campos e em sentido figurativo, teve o efeito de sublinhar ligações e particularidades das estruturas sociais e grupais que, não sendo novas, à força da evidência se tornaram praticamente consensuais. No exemplo da obra de Mafalda Santos, "Ambiente de Trabalho", cujo título nos remete imediatamente para o universo da interface Windows (aqui em português e numa tradução deliciosamente polissémica quando comparada ao seco e estéril "Desktop" original) e que utiliza o seu sistema de organização para, através de uma composição diagramática criar uma imagem simplificada de um momento/lugar de um grupo social e profissional. Sem ambicionar uma posição crítica, atrevo-me a escrever que limitada a uma postura documental, até porque utiliza a linguagem do ordenador, criada visando a universalidade através da redução ao mínimo da possibilidade de subjectividade e divergência. Quando, sobre uma cronologia ou um topos, mentaliza e representa um sistema de pessoas (do qual a autora faz invariavelmente parte) e os seus vínculos, organizando-as através dos seus nomes e títulos de projectos tal como se tratassem de designações de pastas (folder), evidencia a composição e o funcionamento, as proximidades e as diferenças e, finalmente, os limites e fronteiras do ambiente de trabalho da artista, que é, sem mais, o círculo e o campo das últimas gerações de Belas Artes.

A utilização do Alfabeto, e através dele a representação de nomes, veio expor (não arrojo um explicar porque ainda não está provado) o anterior trabalho gráfico sobre estruturas de rede; linhas contrastando contra fundos criando, através da irregularidade do traço, singularidades volumétricas, invocando representações orográficas geometrizadas pela ampliação da unidade mínima da composição (píxel). Nestes casos a rede não é substantiva, não determina ou localiza sujeitos ou objectos, não tem qualquer pretensão cartográfica. As pinturas apresentam-se como resultado de um momento que a artista cataliza, exprimindo um instante e um corte, uma figuração bidimensional de uma realidade que se exprime e opera sobre um número indeterminável de eixos. Esta rede, que achamos óbvia, constrói-se e mantêm-se através dos processos de inscrição, troca, nexo de obrigação mas, para se manter e regular importa e utiliza um número infindável de variáveis. Através da sua representação podemos apenas captar um pormenor e um momento que vive sempre na ameaça de logo deixar de ser assim.

Houve já quem tenha arriscado dizer que o verbo ser é a exacta origem do mundo, uma primeira causa que possibilita e contêm em si toda a gramática da criação, mas na contemporaneidade começam a avolumar-se suspeitas sobre um pretenso campo consciente que indizível porque anterior (ou exterior) ao verbo não deixa contudo de parecer-nos transmissível. A quântica revela-nos que cada partícula do nosso corpo está emparelhada com outra que tanto pode estar mesmo ao seu lado como do outro lado da galáxia e também que estes pares de partículas tem a capacidade de comunicarem o seu estado (spin e carga) instantaneamente uma à outra. A partir deste momento podemos ver e estruturar um Universo em que todas as suas partículas estão ligadas umas às outras através de diversos tipos de ligações formando uma hiper-rede em que a informação flúi sem tempo e na qual é total e totalizante porque está toda e em toda a parte.